o processo analítico e diagnósticos

21 abril, 2025



tem um motivo pelo qual o diagnóstico do seu analista é diferente do que o do seu psiquiatra - e isso não quer dizer que algum deles está errado ou não tem valor. 

Na Psicanálise, o diagnóstico também orienta o tratamento, mas não é uma atribuição fixa e categórica. Ele se constrói no encontro com o sujeito, a partir de elementos do seu discurso, respeitando a singularidade de cada caso. Diferente de outros campos, que buscam a categorização, a Psicanálise aposta na particularidade.

Desde o DSM-III, em 1980, o diagnóstico passou a seguir uma lógica mais empirista, focada na descrição dos sintomas, em um suposto ateoricismo. Isso reforça uma leitura biológica do transtorno, deixando de lado a escuta do sofrimento.

Quinet* alerta que transformar sintomas em transtornos isolados esvazia a investigação do funcionamento psíquico. O diagnóstico vira ferramenta de comunicação e perde sua função clínica.

A Psicanálise, por sua vez, busca justamente abrir espaço para o discurso do sujeito e combater o apagamento que vem da identificação do sujeito com a identidade patológica (diagnóstico), promovendo escuta e circulação do que há de singular.

*A Ciência Psiquiátrica nos discursos da contemporaneidade (1999)

 

objetivos de uma análise

21 abril, 2025


Estamos cada vez mais exigindo coisas — queremos tudo o que achamos que precisamos, e de preferência, pra ontem. A cobrança por rapidez está em toda parte, e a gente acaba levando isso também pra clínica.

Muitos pacientes chegam esperando um alívio rápido, como se a análise fosse uma prestação de serviço como qualquer outra. Mas será que só suprimir o sintoma resolve? Será que dá pra acelerar o processo sem perder o que ele tem de mais potente?

Freud, em Análise terminável e interminável (1937), já dizia que a análise leva tempo — e que as tentativas de adaptar esse tempo à lógica da indústria não funcionam. Porque a análise acontece na transferência, no vínculo que se constrói entre analista e analisando. E esse vínculo… leva tempo pra se firmar e sustentar as dificuldades que aparecem no caminho.

Lacan abre seu Seminário perguntando o que fazemos quando fazemos análise. E o que ele mostra é que o objetivo não é reeducar ou adaptar o sujeito à realidade, mas possibilitar que ele exista de outras formas, com menos sofrimento.

Na minha experiência, muitos sintomas aparecem como denúncia de um mal-estar social. Não acho que o caminho seja se adaptar a isso — nem emocional, nem comportamentalmente. A análise é, pra mim, um processo de apresentação de alguém a si mesmo. E isso exige tempo, vínculo e ética. Não é prestação de serviço. É encontro.

 

Acompanhamento Terapêutico

3 abril, 2025


o acompanhamento terapêutico (AT) é uma estratégia clínica normalmente adotada em casos em que há uma importante questão do paciente com o laço social. Apesar de ser um recurso pouco conhecido no imaginário popular, é uma técnica bastante rica - tanto em sua teoria quanto também em seus resultados. 


o AT surge com a Reforma Psiquiátrica [LEI 10.216], como uma forma de introdução dos pacientes à sociedade após o período de internação. Seguindo a ética psicanalítica, esse dispositivo visa o tratamento sem a exclusão do paciente do laço social, enlaçando a vivência e tratamento do sujeito com as possibilidades da vida em comunidade. 


desta forma, o AT é tanto um acolhimento quanto um dispositivo clínico - uma vez que permite o estabelecimento de transferência e um trabalho analítico com o sujeito, em cenários além do consultório. Isso possibilita que o sujeito crie novas possibilidades de existir - com menos sofrimento - e de fazer laço.


em minha experiência como AT, pude observar o quão importante é esta estratégia clínica - quando necessária a aplicação. os principais quadros que se beneficiam são os de estrutura psicótica e diagnósticos de alta complexidade.


[referências: Clínica do acompanhamento terapêutico e psicanálise - Clarissa Metzger]

 

Saber lidar com o não-saber

25 março, 2025

 

tenho notadamente uma dificuldade em manter um instagram profissional. tenho uma infinidade de questões com isso que, quando levadas a análise, me lembraram as teorizações lacanianas de não-saber. o não-saber entra como uma condição do analista para a escuta do sujeito. por mais que tenhamos aporte teórico, cada caso é único e, assim, devemos sustentar nosso não-saber e caminhar conjuntamente com o paciente para a escuta da singularidade.


às vezes, o não-saber paralisa. ao invés de aceitarmos nossa incompletude, preferimos nos defender do não-saber apenas parando. podemos construir fantasias sobre nós mesmos de que não somos capazes mas, no fim, será que não houve uma predisposição para reconhecer-se que não sabe e enfrentar o novo?


esta é uma maneira que encontrei de lidar com um incômodo e trazer para fora do consultória minha experiência analítica (mesmo que seja do outro lado do divã).